segunda-feira, 22 de maio de 2017

As “pequenas coisas” que foram esquecidas em Lisboa

A gestão da cidade de Lisboa tem sido caracterizada pela aposta nas obras de requalificação do espaço público - obras de grande visibilidade, embora, em muitos casos, com soluções que não melhoraram o dia-a-dia da vida de quem utiliza a cidade.

A gestão da cidade tem sido centrada a pensar mais nos turistas e menos em quem vive em Lisboa.
Lisboa foi engolida por obras por toda a cidade em contra-relógio para estarem prontas para serem vistas nas próximas eleições. No entanto, os crónicos problemas da cidade mantêm-se ou agravaram-se. Não houve sensibilidade nem resposta para os problemas do dia-a-dia de quem vive ou utiliza a cidade. O problema do trânsito é a consequência mais evidente desta acção pouco ponderada. Lisboa pode estar mais agradável à vista, mas os problemas não foram resolvidos.

A disponibilidade financeira do município aumentou, nos últimos anos, de forma impar com um impulso decisivo na diminuição da dívida resultante do acordo com o Governo anterior sobre o pagamento dos terrenos do aeroporto (responsável por 87 % da diminuição da dívida dos últimos dez anos), a par de um aumento de global de receitas de 20% em resultado do brutal aumento de taxas e tarifas (94% em apenas em um ano).

Lisboa vive o deslumbramento de quem gere a cidade com muitos recursos financeiros e quer deixar “obra” quase sem olhar a custos, mas sobretudo sem cuidar das correctas prioridades, preterindo o investimento estrutural ou a resolução dos pequenos problemas do dia-a-dia – que têm menos visibilidade, em favor da obra que “enche o olho” e que muitas vezes é feita a pensar mais nos turistas e menos em quem vive em Lisboa.

O facto é que as obras estão concretizadas e, no entanto, permanecem os problemas crónicos de Lisboa. Em muitos casos as zonas de intervenção foram escolhidas, não por necessitarem mais de intervenção mas por serem mais visíveis. A preocupação com o embelezamento prejudicou a funcionalidade (por exemplo, no trânsito). Importa agora reflectir sobre o que ficou por cuidar em Lisboa.

Lisboa permanece suja e fora das zonas em que foram feitas as grandes obras continua degradada. O lixo continua a acumular-se em muitos pontos da cidade. Nas zonas da cidade à margem dos principais eixos ou praças continuam os pavimentos degradados, os candeeiros em mau estado, os bancos destruídos.

Onde foram feitas obras de renovação do espaço público parece que está tudo a brilhar, mas a restante cidade (grande parte da cidade) parece ter sido esquecida. Não há manutenção do espaço público e não há recuperação do mobiliário urbano.

A actual gestão da cidade parece saber apenas fazer de novo mas não cuida de manter ou conservar o que existe.

E depois temos a limpeza. Continua a observar-se lixo acumulado nas ruas, junto aos ecopontos e às papeleiras. A Câmara não tem sabido resolver o problema do lixo.

Parece que Lisboa só existe nos principais eixos e praças. Parece que em Lisboa só interessam os turistas. Parece que as zonas menos visíveis da cidade e também os lisboetas foram esquecidos.
Em Lisboa temos cenários mais bonitos para tirar fotografias. Mas não se vive melhor em Lisboa. Falta cuidar e resolver os “pequenos” problemas do dia-a-dia de quem vive em Lisboa.

António Prôa

texto publicado no jornal Sol

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