domingo, 24 de julho de 2016

Sobre o anúncio de expansão do aeroporto no Montijo

No dia em que o Governo assume a intenção de vir a desenvolver na actual Base Aérea do Montijo um aeroporto complementar ao aeroporto Humberto Delgado, importa afirmar que tal intenção deveria ter sido precedida de uma discussão e análise participadas pelas autarquias sobre o impacto desta infra-estrutura na cidade e na região de Lisboa.

A expansão da operação do aeroporto de Lisboa no Montijo representa a alteração mais relevante dos últimos anos e terá fortes implicações para a cidade de Lisboa na economia mas também na mobilidade e nas infra-estruturas de transportes. Torna-se, por isso, incompreensível que a Câmara Municipal de Lisboa não tivesse, antecipadamente, discutido e aprofundado as consequências deste cenário no contexto de um diálogo suportado tecnicamente e que envolvesse os vereadores.

A operação do aeroporto no Montijo significará, de acordo com as expectativas anunciadas, uma deslocação diária de dezenas de milhar de pessoas entre as duas margens. Este fortíssimo movimento terá implicará uma forte carga nas estruturas de travessia do Tejo, seja nas pontes e respectivos acessos rodoviários, seja nos transportes fluviais e nos transportes públicos da cidade. Por outro lado, a articulação com o aeroporto Humberto Delgado, bem como com outras infra-estruturas de transportes como os caminhos de ferro, o metropolitano ou o terminal de cruzeiros será essencial.

Importa salvaguardar que a solução de expansão da capacidade aeroportuária de Lisboa para o Montijo será acompanhada e suportada pelos investimentos necessários na criação de uma solução de travessia fluvial, no desenvolvimento e adequação da rede de metropolitano na cidade, nas adaptações da estrutura rodoviária e na articulação entre os diversos meios de transporte público. Tais investimentos terão, necessariamente, de fazer parte da equação dos custos da construção do novo aeroporto.

Importa pois assegurar que, no mais curto espaço de tempo, até porque tal já devia ter acontecido, a Câmara Municipal de Lisboa, na posse dos dados necessários, possa discutir e pronunciar-se sobre as implicações do novo aeroporto do Montijo. Por isso mesmo, na última reunião de Câmara efectuada tive oportunidade de solicitar ao senhor presidente da Câmara a realização para breve de uma reunião exclusivamente dedicada a este assunto. A assinatura do memorando de entendimento entre o Governo e a ANA – Aeroportos de Portugal sobre esta matéria torna urgente que a Câmara Municipal de Lisboa se possa pronunciar e intervir sobre o desenvolvimento deste processo.

A possibilidade de expansão da actividade aeroportuária de Lisboa garantindo a permanência do funcionamento do aeroporto na Portela é uma boa notícia para a economia e para o turismo da cidade e da região de Lisboa. No entanto, importa assegurar que esta possibilidade de desenvolvimento seja acompanhada pelos adequados investimentos complementares de forma a não significar uma diminuição da qualidade de vida na cidade de Lisboa, nomeadamente em matéria de transportes e de mobilidade. O desenvolvimento desta solução só será positiva se forem salvaguardados os interesses dos lisboetas.



António Prôa





(publicado no jornal Oje)

sexta-feira, 8 de julho de 2016

As obras e os ciclos políticos em Lisboa

Passados que são três anos deste mandato da actual maioria na câmara de Lisboa, surgem, ao mesmo tempo, várias obras a decorrer na cidade. Várias obras que têm em comum o condicionamento do trânsito.

Vale apena, ainda assim, sublinhar que a maioria leva três anos deste mandato, mas que governa a câmara há 9 anos.

As eleições ocorrem autárquicas ocorrem de 4 em 4 anos. Mas em momento algum na história da administração local existiu alguma regra que impusesse que todas as decisões de um mandato tivessem que se concretizar nesse mesmo mandato. Se assim fosse, apenas no início de cada mandato haveria lugar a decisões e algumas decisões nunca seriam tomadas pois o tempo de execução impediria que se tomassem decisões com consequência em mandatos seguintes.

Especialmente as grandes intervenções na cidade devem obrigar a um maior período de ponderação, preparação, planeamento e execução. As intervenções estruturais na cidade são incompatíveis com a restrição à sua conclusão num ciclo de um mandato autárquico mas nem por isso devem deixar de ser decididas pois são necessárias.

As grandes intervenções na cidade condicionam a cidade no médio e no longo prazo. Condicionam o desenvolvimento da cidade e também as gestões municipais futuras.

As decisões sobre intervenções que são estruturantes na cidade devem merecer um esforço no sentido de se encontrar um compromisso político alargado. Tal deve ser alcançado através do empenho de quem lidera a câmara para criar um ambiente de confiança e de abertura que propicie a participação política no processo de decisão.

No passado recente o anterior presidente da câmara demonstrou a vontade de encontrar consenso partidário e alcançou o compromisso político em matérias decisivas para Lisboa como foram a definição de um quadro de taxas e impostos estáveis (infelizmente quebrado entretanto com os brutais aumentos resultantes das alterações às tarifas de saneamento e resíduos e com a criação da taxa de protecção civil) ou a reforma administrativa da cidade.

Actualmente parece ter sido abandonada a atitude de procura de entendimentos que promovam a tomada de decisão participada e comprometida com as demais forças políticas representadas na câmara municipal, optando a actual maioria pela imposição de medidas e precipitando a sua concretização.

O exemplo mais notável da postura de imposição e de precipitação revela-se nas obras que decorrem na cidade, algumas das quais estruturantes e que por isso deveriam merecer um compromisso político alargado. Se assim fosse, para além de se evitarem erros nas opções tomadas e que terão consequências no longo prazo na vida da cidade, poderia ter sido adoptado um planeamento na respectiva concretização que evitasse a simultaneidade e, por isso, os incómodos daí decorrentes.
Condicionar grandes intervenções na cidade aos ciclos eleitorais revela falta de atenção à definição estratégica do desenvolvimento da cidade, limita as tomadas de decisão de longo prazo, tem como consequência a precipitação na tomada de decisão e, sobretudo, impõe sacrifícios desnecessários aos lisboetas.


António Prôa
Vereador na Câmara Municipal de Lisboa





(publicado no jornal Oje)

sábado, 2 de julho de 2016

Mudar sem saber para quê em Lisboa

Nos últimos anos, a Câmara Municipal de Lisboa tem adquirido um conjunto de imóveis com o propósito anunciado de relocalizar diversos serviços municipais. Para além da afirmação de mudanças geográficas, importa definir objectivos quanto à melhoria do nível de serviço prestado aos munícipes.

O impulso mais recente para a mudança de morada de vários serviços da câmara foi a necessidade de encontrar localização alternativa para os serviços situados nas instalações da Avenida 24 de Julho em razão da alienação desse imóvel.

Por outro lado, a crónica dispersão de serviços um pouco por toda a cidade há muito que desafiava o município a procurar uma solução de maior racionalidade na respectiva localização.

A necessidade de reorganização geográfica dos serviços municipais é uma preocupação que há muito atravessa várias gestões municipais. A alteração mais notável das últimas décadas foi a concentração de serviços no edifício do Campo Grande. Esta alteração ocorreu com a construção de raiz de um grande edifício que no entanto veio a verificar um conjunto de insuficiências e erros de concepção.

Mas várias outras alterações ocorreram com a reorganização espacial de vários serviços como, por exemplo, os da higiene urbana. Nos primeiros anos deste século começou a ganhar corpo a intenção de reunir junto aos Paços do Concelho alguns serviços, incluindo também os gabinetes dos vereadores que se encontram dispersos pela cidade.

Mais recentemente, a actual maioria que governa o município anunciou a intenção de relocalizar a generalidade dos serviços municipais concentrando-os em três polos (Campo Grande, Olivais e Praça do Município/Baixa). Para tal, nos últimos dois anos, a Câmara Municipal de Lisboa gastou dezenas de milhões de euros com a aquisição ou aluguer de edifícios.

A relocalização de serviços do município deveria ser uma oportunidade para uma verdadeira, mas há muito adiada, reorganização dos serviços que promovesse a respectiva modernização e aumento de eficácia nas respostas de que a cidade carece. No entanto, o que se verifica é apenas uma mudança de instalações.

A Câmara Municipal de Lisboa assistiu, nos últimos anos, a importantes mudanças tecnológicas, alterações no universo das empresas do município e a significativas alterações nas suas competências. Tais alterações deveriam corresponder a uma profunda reestruturação do seu modelo organizacional,
mas o que se verificam são ajustes a um modelo que permanece, no essencial, idêntico há muitas décadas e incapaz de dar resposta adequada às exigências de uma gestão adequada da cidade. O município continua a consumir demasiados recursos no seu funcionamento com manifesta falta de eficiência.

Por outro lado, a relocalização de serviços prevista deveria ter como propósito um conjunto de metas a atingir no que respeita aos níveis de serviço a alcançar. A mudança de instalações deveria corresponder a um aumento programado da capacidade e qualidade da prestação de serviço aos munícipes. Infelizmente, essas metas, esses objectivos, nunca foram concretamente enunciados pela razão de não existirem.

Embora seja muito importante garantir boas condições de trabalho aos funcionários do município, não nos devemos esquecer que a missão do município é a prestação de um adequado serviço à cidade que corresponda às exigências dos munícipes. Neste processo de relocalização dos serviços em Lisboa o actual executivo parece estar a falhar no primeiro e a ignorar o segundo.


António Prôa
Vereador na Câmara Municipal de Lisboa





(publicado no jornal Oje)