sexta-feira, 5 de fevereiro de 2016

Ainda a Segunda Circular ou as consequências de não se saber o que fazer com o dinheiro

Continua animado o debate sobre a intervenção na 2ª Circular. Depois de uma barragem de críticas e preocupações em reacção ao súbito anúncio, o actual executivo apostou no controlo dos danos à sua imagem.

O pano de fundo desta polémica conjuga a proximidade de eleições e os cofres cheios do município. Dito de outro modo, o actual presidente precisa de mostrar obra para se afirmar e o brutal aumento de taxas e tarifas sobre os lisboetas provocou um acréscimo de receitas da câmara muito além do necessário.

Quanto aos recursos financeiros acumulados, está hoje comprovado o impacto e o excesso. Em 2015 o esforço dos lisboetas duplicou, apenas contabilizando as novas taxas e tarifas (protecção civil, saneamento e resíduos). Por outro lado, no final de 2015 o saldo de tesouraria da câmara atingiu o valor recorde de 124 milhões de euros, muito acima do valor previsto (67 milhões de euros).

Por outro lado, Fernando Medina sucede a António Costa à frente dos destinos da capital com um défice de notoriedade em relação ao seu antecessor. Perante este cenário, era vital ultrapassar estas fragilidades de modo a não colocar em risco a manutenção da câmara em mãos socialistas
A maioria socialista recorreu à forma clássica de fazer obras para afirmar a sua presença. E está a fazê-lo utilizando a velha prática de concentrar obras à porta das eleições promovendo o equívoco entre inaugurações e campanha eleitoral.

Para além do lançamento de obras (algumas previstas há muito) um pouco por toda a cidade em simultâneo, ainda se propõe dar início a obras não previstas, não estudadas nem programadas. Se, por princípio, tal procedimento é criticável, torna-se crítico quando se trata de um eixo com a importância da 2ª Circular.

A intervenção agora anunciada para a 2ª Circular não estava prevista, não foi devidamente estudada nem existe programação possível em coordenação com outras intervenções na cidade.

Apenas seis meses antes deste anúncio para a 2ª Circular, o que estava prevista era a intervenção no saneamento e repavimentação da via. Depois foi o que se viu: transformar a 2ª Circular numa avenida urbana ilustrada por desenhos idílicos e afirmações equívocas numa tentativa de afirmar aquela intervenção num símbolo da maioria socialista. A diferença é também no valor envolvido que passa para o dobro…

Agora que o escrutínio público (e político) obrigou a regressar a algum realismo, a intervenção na 2ª Circular passou a ser constituída por “duas fases” (sendo que quase tudo de significativo fica para essa “segunda fase” não calendarizada). Por agora ficam algumas árvores (muito menos do que as inicialmente referidas), aparece uma divisória para evitar atravessamentos, diminui a ambição de redução de tráfego e outras “alterações”.

Na verdade, sob a capa da abertura à participação pública, vão-se retirando os sinais da precipitação de uma intervenção que parece que só agora está a ser estudada. Entretanto, espera-se que seja concluído o estudo de tráfego que (imagine-se!) não sustentou a proposta inicial.

Pode até concluir-se que esta intervenção na 2ª circular de pouco servirá os objectivos de redução de tráfego, de diminuição dos níveis de poluição sonora e do ar ou de limitação da sinistralidade, mas já serviu de suporte à campanha eleitoral da actual maioria. Uma campanha demasiado cara…


António Prôa
Vereador na Câmara Municipal de Lisboa





(publicado no jornal Oje)

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