segunda-feira, 31 de julho de 2017

Calçada portuguesa: identidade de Lisboa, património mundial

Foram esta semana lançadas as bases para o reconhecimento da calçada portuguesa património imaterial da humanidade. Deste modo, Lisboa e Portugal afirmam a sua identidade e salvaguardam o seu património divulgando a cultura. O chão que pisamos é história, cultura e arte. A calçada portuguesa pode e deve ser compatível com as exigências de conforto e segurança. Estes são os desafios.

A decisão da Câmara Municipal de Lisboa em se associar a diversas entidades públicas e privadas com o objectivo de preservar, promover e valorizar a calçada portuguesa, bem como de alcançar a classificação de património da humanidade constitui um marco para a afirmação da identidade de Lisboa no mundo.

A Calçada Portuguesa inspirou-se nas técnicas de pavimentação utilizadas por romanos e árabes, tendo sido adaptado e desenvolvido tendo em conta os materiais disponíveis e de modo a corresponder às necessidades de utilização.

A calçada portuguesa, com as características com que hoje a reconhecemos, começou a ser utilizada em Lisboa no século XIX, primeiro no Castelo de São Jorge (então uma prisão) aplicada por presidiários a mando do governador de armas do castelo - tenente-general Eusébio Pinheiro Furtado, a quem foi posteriormente confiada a tarefa de executar a pavimentação em calçada portuguesa da Praça do Rossio.

A partir do Rossio a calçada portuguesa rapidamente se espalhou, primeiro em Lisboa, depois por todo o país e um pouco por todo o mundo onde se fala português, seja nas antigas colónias portuguesas, seja onde existe ou existiu presença de comunidades de portugueses.

A calçada portuguesa constitui um elemento de forte identidade associado a Portugal e em particular à cidade de Lisboa. Os padrões utilizados constituem elementos que caracterizam os espaços onde se inserem. A riqueza e diversidade dos motivos aplicados contribuem para a valorização do espaço público.

Do ponto de vista económico, a calçada portuguesa contribui para a economia nacional pois utiliza recursos naturais extraídos no nosso país e as empresas do sector da extracção, da transformação e também da aplicação, são pequenas e médias empresas nacionais.

A ideia de que a calçada portuguesa é um pavimento antiquado, desconfortável, perigoso e por isso incompatível com uma cidade moderna e acessível não corresponde à verdade e resulta dos problemas de manutenção e massificação.

A massificação da utilização da calçada conduziu à perda de qualidade deste pavimento. A falta de fiscalização adequada ou a falta de profissionais qualificados tem conduzido à degradação de pavimentos em calçada tornando-os pouco confortáveis ou até inseguros.

A calçada portuguesa bem aplicada e adequadamente mantida é um pavimento capaz de assegurar todas as exigências de conforto e segurança de uma cidade moderna. Se a estas condições se aliar a protecção do património, a formação profissional, a utilização de novas técnicas e a criação artística, então a calçada passa a ser um elemento que transporta a história e a identidade da cidade e a projecta para o futuro, constituindo-se um elemento de importância estratégica Lisboa e para o país.

No centro está um ofício e uma arte. O calceteiro tem um trabalho duro, desgastante e pouco valorizado. Importa reconhecer o seu papel central na construção do chão que queremos pisar.


António Prôa


texto publicado no jornal Sol

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