quinta-feira, 26 de março de 2009

Sentido de Estado ou bom senso?

O mandato do actual Provedor de Justiça terminou há cerca de oito meses atrás. Os dois partidos obrigatórios para concretizar a substituição através da eleição com uma maioria de dois terços não conseguiram faze-lo. Uma vez mais a imagem dos partidos políticos fica enfraquecida. Uma vez mais a imagem da Assembleia da República sai fragilizada.

Compreensivelmente, após oito meses de espera para ser substituído, o ainda Provedor de Justiça, veio manifestar a sua incomodidade perante a situação. Nascimento Rodrigues foi claro na justificação da situação a que se chegou: o partido maioritário quer também ocupar este cargo numa ânsia de hegemonia em relação a todos os cargos públicos.

A credibilidade do actual Provedor de Justiça impôs um peso às suas palavras que deixou os dirigentes do partido socialista num estado de nervosismo que contagiou o próprio primeiro-ministro. Só isso justifica a total falta de sentido de estado e a irresponsabilidade das reacções que se seguiram: o partido socialista atirou para a praça pública nomes propostos para ocuparem o cargo em questão na tentativa de criar uma cortina de fumo perante o verdadeiro problema tão sabiamente apontado por Nascimento Rodrigues.

A escolha do Provedor de Justiça depende do acordo entre os dois maiores partidos. A dignidade do cargo e o sentido de estado deveriam manter as negociações necessárias reservadas. Quem vem para a praça pública atirar nomes não quer resolver problemas, antes manifesta uma total ausência de sentido de estado. Quem persiste teimosamente em querer decidir todas as nomeações de cargos públicos, sacrificando o vital equilíbrio democrático, revela falta de bom senso.


texto publicado no jornal Meia Hora

sábado, 21 de março de 2009

quinta-feira, 19 de março de 2009

A água não se fabrica


Decorre esta semana em Istambul na Turquia o Vº Fórum Mundial da Água para debater o problema da escassez de água.

Prevê-se que dentro de 20 anos, cerca de 2/3 da população mundial sofra com a escassez de água. Os próximos conflitos e guerras no mundo serão em função do controle de rios e albufeiras e da distribuição da água. Também em Portugal, a permanência dos actuais padrões de consumo de água poderá provocar a escassez de água.

Quem vive em locais onde basta abrir a torneira para obter água potável, esquece que essa água sofreu um processo de tratamento e transporte dispendioso.

A Matriz da Água de Lisboa elaborada pela Agência Lisboa E-Nova em 2006, reúne informações surpreendentes: O consumo anual de água é de 74,5 milhões de m3. As perdas são de 19,5 milhões de m3. Cerca de 42% do consumo de água corresponde a usos domésticos. Destes, 49% é gasto em duches e 22% em autoclismos. A câmara consome 7 milhões de m3 de água para regas e lavagens de ruas e cerca de 59 milhões de m3 de águas residuais tratadas não têm qualquer aproveitamento.

É urgente mudar comportamentos no uso da água. O gesto de cada um conta.

É necessário continuar a investir na diminuição das perdas ainda significativas em Lisboa. Por outro lado, é urgente aplicar uma política integrada para o uso racional da água, através da generalização de sistemas de rega automática racional, da adopção de plantas com baixas exigências hídricas nos jardins, mas também pelo aproveitamento da água residual tratada para a rega e lavagem de ruas. Lisboa pode e deve dar o exemplo no uso sustentável da água.

A água não se fabrica. Urge promover o uso racional e sustentável de um recurso tão valioso como é a água.


texto publicado no jornal Meia Hora

quarta-feira, 18 de março de 2009

O cúmulo da demagogia

Em plena campanha (não estará desde o início do seu mandato?), António Costa apresentou ontem as medidas para o simplis versão 2009 como é noticiado aqui. De entre as 38 medidas anunciadas (os anúncios são a especialidade de António Costa) surge a medida "a minha rua". Uma ideia interessante copiada de vários exemplos em cidades europeias (não há qualquer inconveniente em copiar boas ideias).

Esta iniciativa pretende criar mais um meio para que os lisboetas possam comunicar pequenos problemas no funcionamento da cidade (iluminação, calçadas, lixo, etc.). Tudo apresentado como novo. Mas não é! Recordam-se do serviço Lx Alerta? Nem mais! Ou melhor, aparentemente a menos. O serviço Lx Alerta foi criado durante o mandato de Santana Lopes para facilitar a comunicação de problemas da cidade, faltava-lhe a componente interactiva através da plataforma agora introduzida. O Lx Alerta foi dotado de meios próprios ou partilhados de forma a responder com maior rapidez às solicitações. Foi uma iniciativa que resultou muito bem com uma avaliação e monitorização que comprovam o sucesso. Depois, já no mandato de Carmona Rodrigues, procurei, com base na experiência recolhida, constituir, no âmbito do Lx Alerta, as "brigadas de intervenção rápida" de forma a optimizar o serviço. Os trabalhos preparatórios ficaram concluídos e na posse dos serviços. Agora tenta apagar-se o que existe e aparece este anúncio sem cuidar de adequar a capacidade de resposta às novas solicitações. É por isso uma iniciativa de fachada porque muito mais importante que poder comunicar um problema num mapa na internet, é ver a questão resolvida em tempo útil.

Curiosamente, esta medida é anunciada para entrar em funcionamento apenas em Setembro... Um mês antes das eleições.... Dá vontade de dizer: "quem vier que feche a porta"! António Costa anuncia, até põe em funcionamento a parte fácil que é receber queixas, mas depois, a sua resolução ficará para quem vier a seguir. A dificuldade está em, com os meios limitados disponíveis, conseguir dar resposta com a celeridade prometida aos problemas colocados. Mas isso ficará para quem vier a seguir. Por agora fica apenas a criação de expectativas. Assim é fácil!

quinta-feira, 12 de março de 2009

Lisboa com sentido


Tiros em Lisboa são problemas de Lisboa

Os conflitos sociais e raciais a que os lisboetas assistiam pelas televisões nos bairros de concelhos limítrofes parecem ter entrado dentro de Lisboa. As cenas de tiros e desacatos deste fim-de-semana no bairro Portugal Novo, nas Olaias, em pleno centro de Lisboa, são idênticas às observadas noutros bairros da periferia de Lisboa.

Os que até agora eram os problemas “dos outros” passaram agora a ser problemas de quem vive em Lisboa. Passaram a ser também problemas de Lisboa.

É neste contexto que se tornam surpreendentes as declarações do presidente da Câmara Municipal de Lisboa que afirmou nada ter que ver com aquela questão. Para António Costa “aquilo” é um problema de polícia, não é um problema do presidente da câmara…

Como é possível!? É impensável que um presidente da câmara de Lisboa considere que algum problema que se passe em Lisboa não seja um problema seu. Neste caso foram lisboetas que andaram aos tiros. Não serão estes problemas de Lisboa?! Agora que passaram para dentro da cidade há quem não os queira enfrentar. É seguramente mais fácil fazer de conta que não é nada connosco.

E ainda que seja também (mas não só) uma questão de polícia, que papel pode ter a polícia municipal? Claro que é mais fácil apontar culpas ao governo. Conveniente, até para fazer de conta que se bate o pé ao governo.

Na noite em que se verificaram os confrontos no bairro Portugal Novo em Lisboa e no dia que se seguiu, os moradores, em grande maioria alheios aos desacatos, não sentiram o apoio do presidente da câmara, nem tão pouco de qualquer vereador. Apenas do presidente da junta de freguesia. Assim se vê como cada um encara as suas responsabilidades.


texto publicado no jornal Meia Hora

terça-feira, 10 de março de 2009

Presidente de câmara a sério

O presidente da Câmara Municipal de Lisboa, perante os incidentes ocorridos no bairro Portugal Novo, nas Olaias, não encontra afirmação mais adequada do que dizer que não tem nada que ver com o que se passou.

António Costa resume assim o problema: «Assaltar uma casa ou dar tiros não é um problema urbanístico, é um crime», logo não é um problema do presidente da câmara...

É esta atitude que resume o problema do Dr. António Costa: não tem jeito para presidente de câmara. Ainda não conseguiu despir o fato de ministro. A diferença é que agora se comporta como ministro de Lisboa e ainda por cima com um problema de relacionamento mal resolvido com o sucessor na administração interna. Lisboa é quem paga...

É inadmissível que um presidente de câmara de corpo inteiro se consiga afastar assim dos problemas da cidade. Só porque lhe dá jeito. Só para poder atacar o seu sucessor no ministério. Mas então deveria ser coerente. Há muito que as autarquias se substituem à administração central em muitas matérias: saúde, pobreza, educação, desporto, cultura, etc. Será que podemos esperar que o Dr. António Costa comece a rejeitar responsabilidades também nestas áreas?

Para um presidente de câmara a sério, qualquer problema em Lisboa é um seu problema.

sexta-feira, 6 de março de 2009

Fado dos contentores




Já ninguém parte do Tejo
Para dobrar bojadores
Agora olho e só vejo
Contentores contentores.

E do Martinho Pessoa
Já não veria o vapor
Veria a sua Lisboa
Fechada num contentor.

Por mais que busques defronte
Nem ilhas praias ou flores
Não há mar nem horizonte
Só contentores contentores.

Lisboa não tem paisagem
Já não há navegadores
Nem sol nem sul nem viagem
Só contentores contentores.

Entre o passado e o futuro
Em Lisboa de mil cores
O sonho bate num muro
De contentores contentores.

Por isso vamos cantar
O fado das nossas dores
E com ele derrubar
O muro dos contentores.

[Manuel Alegre, 04.03.2009]

quinta-feira, 5 de março de 2009

Propaganda que não dá jeito

Com que autoridade vem a câmara de Lisboa falar em moderação da propaganda?

A generalidade dos partidos políticos decidiu aceitar o desafio da Câmara Municipal de Lisboa para se absterem de colocar “outdoors” em algumas das praças de Lisboa. É uma atitude digna de registo. É um primeiro passo no sentido de diminuir os impactos negativos resultantes destas acções.

É de saudar a preocupação da CML com a salvaguarda do espaço público em matéria de propaganda. Com efeito, é manifesto o excesso de propaganda em Lisboa. Publicidade em suportes desadequados, ou com excessivo impacto visual, ou até ilegal.

Mas não deixa de ser curiosa esta súbita preocupação da CML com as restrições à propaganda política precisamente na altura em que os partidos e movimentos candidatos aos vários actos eleitorais – também às eleições autárquicas de Lisboa, começarão a difundir as suas propostas ou as suas críticas. Porque não iniciou esse esforço antes (dando continuidade ao trabalho efectuado no mandato anterior)?

Depois da invasão totalmente desregrada de publicidade em toda a cidade como sucedeu no último Natal ou com a total ocupação de praças e até da principal avenida com acções publicitárias que repetidamente impedem a circulação das pessoas, com que autoridade vêm os actuais responsáveis falar em moderação da publicidade?

Para voltar a haver uma atitude positiva nesta matéria, a câmara deverá começar por voltar respeitar as normas criadas no mandato anterior para o licenciamento de telas publicitárias com o objectivo de restringir a sua colocação especialmente nas zonas históricas e monumentais e deverá retomar o combate à publicidade ilegal que então permitiu limpar os principais eixos de Lisboa.


texto publicado no jornal Meia Hora